Como Antonio Regalado reporta no MIT Technology Review, o neuroscientista Nenad Sestan, de Yale, descreveu o novo sistema em 29 de março durante um encontro para discutir a ética de pesquisas avançadas sobre cérebro no NIH (National Institutes of Health).
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A técnica, chamada BrainEx, restaura a circulação de cérebros decapitados usando um sistema de bomba, aquecedores de sangue artificial rico em oxigênio aquecido com a temperatura do corpo. O ponto é restaurar a “micro-circulação”, permitindo que o oxigênio reabasteça pequenos vasos de sangue do cérebro. Sestan disse que experimentou a técnica em “algo entre 100 e 200 cérebros de porco”, que ele comprou em um abatedouro. Os órgãos foram mantidos vivos (se é que podemos usar esse termo) por até 36 horas.
As cabeças passaram pelo processo BrainEx quatro horas após a “morte”. Mas pelo fato de certos aspectos da função cerebral terem sido preservadas e pelo fato de os cérebros terem sido mantidos “vivos”, seria mais preciso dizer que as cabeças estavam “ligadas” após a decapitação, e não após a morte. De fato, a técnica tem potencial para bagunçar as concepções tradicionais de morte, e nosso senso de quando ela deveria ser declarada. Isso também pode ajudar nas operações futuristas chamadas de “transplantes de cabeça”.
Dito isso, a técnica não foi desenvolvida para permitir o transplante de cérebro ou preservação em longo termo. Em vez disso, a técnica poderia ser usada para melhorar nossas compreensão da composição do cérebro e sua função, e desenvolver terapias para pessoas em coma, pacientes com câncer, pessoas que sofrem de demência, entre outras doenças neurológicas.
Ao usar um eletroencefalograma, a equipe de Sestan não detectou sinais de consciência nos cérebros dos porcos. Em vez disso, eles viram uma onda cerebral plana, que é um indicador de estado de coma. Ao mesmo tempo, no entanto, o tecido e as células do cérebro pareciam “surpreendentemente boas”, nas palavras de Sestan, ou com aparência saudável e capazes de funcionar normalmente.
Como nota Regalado, Sestan não esperava que seus comentários feitos no NIH sobre o sistema BrainEx se tornassem públicos, mas ele agora aguarda que os resultados do seu trabalho sejam submetidos a um periódico científico para análise de pares.
Esta não é a primeira vez que o cérebro de um animal é mantido vivo fora do corpo. No início da década de 90, cientistas usaram uma técnica similar para manter cérebros de porquinhos da índia vivos. A diferença aqui é que o cientista de Yale conseguiram o feito no cérebro de um mamífero de grande porte, o que significa que a técnica provavelmente pode ser aplicada a cérebros humanos.
“Hipoteticamente, alguém pode usar essa tecnologia, melhorá-la e restaurar a atividade cerebral de alguém”, disse Sestan durante o encontro NIH. “Isso é restaurar um ser humano. Se a pessoa vai ser memória, eu enlouqueceria completamente.”
Debate ético
Especulações à parte, não está claro pelos experimentos quais danos foram impostos nos cérebros pelo período de quatro horas após a decapitação ou pelo procedimento BrainEx. As tecnologias e os conhecimentos médicos necessários para reparar tais danos ainda estão para serem desenvolvidos, então isso vai demorar um pouco — ou nunca veremos — para vermos a extensão de vida aplicada a cérebros humanos, ou a perspectiva de haver transplantes de cérebro.
“Seria um passo impossível chegar a esse ponto com um cérebro humano”, disse Frances Edwards, um professor de degeneração neural da Universidade College London, ao Guardian. “Tanto no porco como no humano, todo o cérebro está disponível na morte, mas no caso do porco, você está pegando um animal saudável e tendo a habilidade controlar exatamente quando e como ele morre e imediatamente retirar o cérebro. Seria necessário que ele fosse resfriado em alguns minutos e depois reaquecido quando for oxigenado.” Ela disse que esse tipo de experimento não é possível em humanos, argumentando que nesses casos onde um indivíduo é declarado com morte cerebral, “até o tempo de o cérebro estar acessível, ele estaria comprometido.”
Além disso tem a questão da ética nesses experimentos feitos em Yale. O porco está realmente vivo? Qual deveria ser o critério para declaração da morte? A morte deveria estar ligada a funções do corpo ou do cérebro, ou deveria ser declarada uma vez que o fim da consciência fosse garantida? Com o passar do tempo, os avanços tecnológicas continuarão a fazer essas perguntas ainda mais difíceis de serem respondidas.
Sestan disse que os cérebros dos porcos não mostraram nenhum sinal de consciência, mas e se isso estiver errado? Ou e se o futuro, com uma versão mais avançada do BrainEx, esses cérebros mostrarem sinais de consciência? É um cenário tenebroso trazer de volta a consciência cérebros sem nenhuma conexão com o mundo exterior. Os cientistas precisarão ir com muito cuidado nesse ramo para poder avançar.
E, de fato, essa foi a opinião de um editorial da Nature publicado recentemente por um grupo de neurocientistas e bioeticistas, incluindo Sestan. Os autores disseram que novas regras e proteções são necessárias para fazer experimentos com tecidos cerebrais humanos, incluindo os chamados cérebros organóides ou mini-cérebros, quimeras homem-animal (mistura de genes humanos e não humanos), e pedaços de tecido de cérebro humano removidos durante cirurgias.
Tudo isso faz sentido, mas como a pesquisa de Yale demonstra, nós também precisamos ter cuidado na condução desse tipo de pesquisa em animais, já que o potencial de abuso é bastante alarmante.
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